“A gente ama nota fiscal.” Assim, Isis Abbud define sua relação e a de sua empresa com esses documentos burocráticos que, para muitas companhias, não servem para muita coisa além de oficializar valores de compra e venda para cobranças. Para a Qive, da qual Isis é cofundadora e co-CEO, as notas fiscais são matéria-prima usada para gerar dados inteligentes voltados à melhoria da operação, da gestão e dos fluxos financeiro, fiscal e comercial.
“Temos usado as notas fiscais a favor das empresas, para gerar informações ricas que as ajudem a desenvolver seus negócios com mais estratégia”, disse a executiva ao BRAZIL ECONOMY.
A Qive, que nasceu em São Carlos (SP) como Arquivei em 2014 e mudou de nome há um ano, após um processo de rebranding, processa atualmente 8 bilhões de documentos, que movimentam R$ 3 trilhões de cerca de 210 mil empresas brasileiras. Esse montante triplicou desde 2019, quando R$ 1 trilhão em compras e vendas de produtos e serviços passava pela plataforma.
Em termos de faturamento, a Qive cresceu 40% em 2020, 50% em 2021, 70% em 2022, 40% em 2023 e 40% em 2024, devendo encerrar 2025 com alta de 35%. A empresa projeta manter uma média anual entre 35% e 40% nos próximos dois anos.
Mas é uma perspectiva conservadora, diante da evolução das soluções que a Qive vem desenvolvendo, especialmente no setor de pagamentos, em que tem se tornado uma fintech.
A companhia já oferece uma ferramenta de pagamentos automatizados a partir das notas fiscais que gerencia para os clientes. A solução é conectada diretamente ao banco das empresas, e as transações são feitas sem sair da plataforma da Qive.
Agora, está sendo preparada uma evolução dessa solução, para tornar a experiência ainda mais fluida. O lançamento está previsto para o início do próximo ano. “Estamos evoluindo aos poucos, mas a intenção é expandir bastante em pagamentos, para ajudar as empresas a comprarem melhor”, frisou a co-CEO da Qive, que já iniciou também uma operação de Portal do Fornecedor.
“Já conseguimos deixar essa relação entre cliente e fornecedor mais saudável. O cliente tem um processo de pagamento mais seguro, e o fornecedor sabe exatamente onde está o pagamento, se foi feito ou não, em que momento e por qual canal”, explicou a executiva.
Quem faz essa conexão toda são as notas fiscais. “E, com a evolução da nossa ferramenta, poderemos ajudar as empresas em um passo anterior às compras.”
O desenvolvimento do portfólio da Qive está ancorado em um investimento de R$ 260 milhões, recebido em 2021 em uma rodada Série B, liderada pelo fundo de venture capital Riverwood Capital.
Clientes
Entre os 300 grandes clientes da Qive estão Natura, Avon, Boticário, Mary Kay, Riachuelo, C&A, Aramis, McDonald’s, Burger King, Habib’s, Giraffas, Faber-Castell, Bayer, Casas Bahia e Kraft Heinz.
Essas empresas estão usando a nota fiscal como um ativo de informação, capaz de mostrar o que foi comprado, de quem, quanto foi gasto, com que frequência, em quais estados e uma série de outros dados.
Elas passaram a enxergar a operação de backoffice de maneira mais ativa, em vez de apenas cumprir processos para evitar problemas com a Receita Federal, pagamentos equivocados, multas ou fraudes. É uma área essencial, mas que tradicionalmente recebe menos investimento do que marketing, desenvolvimento de produtos e vendas.
Segundo Isis Abbud, esse cenário vem mudando rapidamente. “Ainda há muitas empresas com processos extremamente manuais. Até achei que essa evolução que vemos agora demoraria mais.”
Uma das companhias que adotaram as soluções da Qive foi o iFood, que, apesar de ser nativa digital, ainda mantinha processos analógicos no backoffice fiscal. No início, foi detectado que 30% das notas fiscais de fornecedores estavam com pagamentos em atraso.
“Hoje estão com 99,7% dos pagamentos em dia, sem pagar multa. E os 0,3% restantes são contratos e negociações mais sensíveis, que eles optam por manter sob controle direto por estratégia”, contou a fundadora da plataforma de gerenciamento de documentos.
Outra empresa cliente, cujo nome será mantido em sigilo, pagava anualmente entre R$ 6 milhões e R$ 10 milhões em multas fiscais. O gasto, inclusive, já fazia parte da previsão orçamentária da companhia, de tão recorrente que era.
“Ajudamos as empresas a pensarem de uma maneira diferente. Além de organizarmos os pagamentos, avaliamos se eles estão corretos ou não, levando em consideração o CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas) da corporação e os tipos de produtos e serviços adquiridos”, disse a executiva da Qive.
Ela ressalta que a reforma tributária, que entra em vigor a partir de janeiro, deve gerar ainda mais casos desse tipo. E será mais uma via de crescimento para a plataforma, que ama as notas fiscais e transforma esses documentos, que muitos evitam, em inteligência de dados.