Um caso dramático de isolamento causado pelo avanço do desmatamento e da infraestrutura foi revelado pela agência France Presse: cinco macacos vivem encurralados entre uma plantação de soja e um lago artificial criado por uma hidrelétrica, em um fragmento de mata no município de Sinop, a 503 km de Cuiabá..
O alarme da floresta chegou na forma de um visitante inusitado: um zogue-zogue apareceu no telhado da casa do agricultor Armando Schlindwein, de 62 anos, em plena manhã. Era um dos primatas que habitam as árvores de sua propriedade. Até então, nunca haviam se aventurado fora da copa. O que parecia curioso era, na verdade, um reflexo desesperado da falta de espaço.
A pequena família — quatro adultos e um filhote — está cercada por dois inimigos poderosos: o desmatamento acelerado pelo avanço da soja e a elevação das águas da UHE Sinop, que inundou antigos corredores naturais. O grupo sobrevive hoje em um fragmento de floresta menor que quatro campos de futebol, isolado em um ponto do mapa chamado “arco do desmatamento”.
O zogue-zogue-do-norte (Plecturocebus grovesi), com barba alaranjada e menos de 1 kg, é um dos primatas mais ameaçados do mundo. Em 2022, entrou para a lista dos 25 primatas mais ameaçados do planeta, segundo a publicação Primates em Perigo. Já perdeu mais de 40% do habitat e, se nada mudar, 80% da população pode desaparecer em duas décadas.

“Não adianta só tirar foto. A gente entendeu que precisa trabalhar todo dia pra preservar esses animais”, afirma Schlindwein, morador do assentamento Gleba Mercedes, que hoje trata os uivos matinais dos macacos como parte da paisagem. “Me acostumei a acordar com a vocalização deles. Pra mim, são como galos.”
Com apoio de organizações como o Instituto Ecótono e o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAR), a comunidade plantou, no ano passado, sementes de 47 espécies nativas em um hectare de área desmatada. A meta é ampliar o território disponível para os macacos e reconectar os fragmentos florestais, criando um caminho verde para a sobrevivência.
A expectativa é que, em cinco a sete anos, a nova floresta permita que os animais possam migrar com segurança, triplicando a área de vida da família isolada.
Mas do outro lado, há mais um obstáculo
A construção da UHE Sinop, parte de um complexo de quatro hidrelétricas, transformou um riacho em um lago de 300 metros de largura.
“Eles não têm como atravessar. Estão presos entre a plantação e o lago”, afirma Anthony Luiz, do MAR. “Além disso, a empresa cumpriu apenas 30% da supressão vegetal obrigatória. As árvores que ficaram apodrecendo debaixo da água matam os peixes.”
A empresa Sinop Energia, controlada pela EDF Brasil e pela Eletrobras, afirma que cumpre “todas as exigências legais e ambientais” e que monitora a fauna, a flora e a qualidade da água. Também informou que, desde 2020, executa o Programa de Monitoramento de Primatas Ameaçados, acompanhado pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente.
Enquanto os relatórios ambientais seguem em análise, os cinco macacos continuam encurralados — sobrevivendo com ajuda de moradores que, em vez de apenas observar, decidiram plantar árvores todos os dias para abrir caminho de volta à floresta.