O Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) instaurou 50 sindicâncias para investigar magistrados de 1º grau nos últimos cinco anos, das quais cinco seguem em andamento. No mesmo período, quatro juízes foram afastados das funções, número que hoje chega a cinco em todo o Estado. Os dados foram obtidos pelo Primeira Página por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI), em resposta oficial da Corregedoria-Geral da Justiça.
As estatísticas ganham ainda mais relevância diante da sucessão de afastamentos recentes. Nesta quinta-feira (26), os juízes Tatiana dos Santos Batista, de Vila Bela da Santíssima Trindade, e Renato José de Almeida Costa Filho, de Chapada dos Guimarães, foram suspensos cautelarmente por indícios de conduta irregular.
Produtividade mascarada e conduta sob suspeita
Relatório assinado pelo corregedor-geral da Justiça, desembargador José Luiz Leite Lindote, ao qual o Primeira Página teve acesso, detalha falhas graves na gestão da Comarca de Vila Bela. Tatiana foi acusada de abandonar a unidade, acumular mais de dois mil processos e utilizar “despachos balão” – decisões genéricas lançadas apenas para simular movimentação no sistema, sem avanço real. Ela também descumpria a obrigatoriedade de realizar audiências de custódia presenciais e passava longos períodos fora da comarca, e até fora de Mato Grosso, sem autorização.

Renato, por sua vez, foi afastado por 140 dias, acusado de baixa produtividade e suspeita de conduta funcional inadequada. Ambos terão suas condutas analisadas em Processos Administrativos Disciplinares (PADs).
O caso Ivan Lúcio: suspeita de propina milionária
Outro caso emblemático é o do juiz Ivan Lúcio Amarante, da Comarca de Vila Rica, afastado desde maio de 2024. Ele é investigado pela Polícia Federal por suspeita de receber R$ 6 milhões em propina em troca da venda de sentenças, valor que equivale a 3,8% da receita bruta do município no período.
As investigações integram a Operação Sisamnes, deflagrada após o assassinato do advogado Roberto Zampieri, morto em 2023 em Cuiabá. Mensagens encontradas no celular da vítima apontaram indícios de corrupção no Judiciário, incluindo venda de decisões e movimentações financeiras suspeitas.
Sindicâncias e afastamentos de juízes — últimos 5 anos
juízes investigados
50 SINDICÂNCIAS
Instauradas entre 2019 e 2025.
2019–202550 procedimentos
em andamento
5 processos
Procedimentos ainda não concluídos.
afastados no período
4 2019–2025
Magistrados de 1º grau afastados nos últimos cinco anos.
atualmente afastados
5 em MT
Contagem atual de juízes fora da função.
No curso do inquérito, a PF identificou 43 depósitos, somando R$ 750 mil, feitos pela esposa do magistrado, Mara Patrícia Nunes Amarante, entre setembro de 2023 e julho de 2024. A defesa alegou que os valores seriam destinados ao “desenvolvimento espiritual e religioso” do juiz. A investigação também relaciona o magistrado ao lobista Andreson de Oliveira Gonçalves, suspeito de atuar em gabinetes do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Ambos foram indiciados por corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa.

O relatório final da PF foi encaminhado ao ministro Cristiano Zanin, no Supremo Tribunal Federal, que remeteu o caso à Procuradoria-Geral da República para definição dos próximos passos.
Outros casos e inspeção do CNJ
Além dos três juízes de 1º grau, a juíza Maria das Graças Gomes da Costa, de Rondonópolis, também está sob investigação. Embora permaneça no cargo, a sindicância contra ela foi convertida em PAD após o marido, o empresário Antenor Salomão, ser acusado de feminicídio em 2023. O TJMT apura possíveis implicações funcionais decorrentes da proximidade com o réu.
As decisões coincidem com a inspeção do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no Judiciário de Mato Grosso. O corregedor nacional, ministro Mauro Campbell Marques, declarou que o objetivo é resguardar a ética judicial e afirmou que “magistrado que recebe propina é criminoso, não é magistrado”.
Em 2024, dois desembargadores já haviam sido afastados pelo CNJ sob suspeita de venda de sentenças e ligação com Roberto Zampieri.
Em nota emitida à época dos afastamentos, o TJMT afirmou que todos os procedimentos tramitam em sigilo e respeitam o devido processo legal e as garantias constitucionais dos envolvidos. A Corte reiterou compromisso com a transparência e a responsabilização em casos de desvios de conduta.
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