“Antes o brasileiro via qualquer produto chinês como sinônimo de baixa durabilidade e confiabilidade, mas isso mudou”, disse Atilio Rulli, VP de Relações Públicas e Institucionais da Huawei no Brasil e América Latina. Com mais de 15 visitas à China, ele vem acompanhando de perto a evolução da tecnologia no país asiático junto de uma grande campanha para convencer a opinião pública em todo o mundo de que essa ideia de produtos chineses de má qualidade não passa de uma grande balela.
“A própria China pensou em mudar o famoso termo Made in China para Create in China com o objetivo de mostrar ao mundo que os produtos chineses não são apenas fabricados lá. São criados. E como uma tecnologia avançada. Hoje, este paradigma foi quebrado e as pessoas observam qualidade acima do preço ao adquirir um produto vindo de lá”, afirmou Rulli.
Os números exemplificam isso: dados da Counterpoint Research apontam que no primeiro semestre deste ano, a Huawei cresceu 11% no mercado global de smartphones em comparação com 2024, o melhor desempenho entre todas as marcas avaliadas pela pesquisa. A receita de vendas no ano passado foi de mais de US$ 120,1 bilhões.
Embora os números de vendas no Brasil ainda não sejam abertos, a Huawei Cloud, que é a divisão de nuvem da companhia, registrou que a receita da empresa no Brasil cresceu 100% em relação ao ano anterior, o que torna o País um dos principais para a empresa na América Latina. E mais do que isso: a coloca muito além de uma “simples” vendedora de smartphones, com potencial de causar um maremoto nos mares seguros onde navegavam até pouco tempo a norte-americana Apple ou a sul-coreana Samsung.
Embora os aparelhos de smartphones sejam o que mais agrada a vida do brasileiro, a Huawei se difere dos concorrentes no tamanho do portfólio disponível no mercado local: com mais de uma área de negócios, a gigante chinesa investe em infraestrutura corporativa, nuvem e até em energia fotovoltaica, considerando que o Brasil é um grande celeiro no contexto da transição energética. O investimento em data centers no País também está nos planos da companhia para os próximos anos.
O ano de 2020 foi um marco de transformação na estratégia de vendas de smartphones para a Huawei em todo o mundo, inclusive no Brasil, quando a empresa passou a sofrer alguns banimentos por parte das corporações dos EUA, fazendo com que o grosso de suas vendas ficasse apenas dentro da China. Até aquele momento, o sistema utilizado era o Android, ligado ao Google, que repentinamente impediu o acesso aos aparelhos chineses. Por outro lado, isso permitiu que a Huawei investisse em novas tecnologias, como no Harmony OS, seu sistema próprio, disponível nos smartphones.
Por isso, Rulli nega que a diminuição dos negócios no Brasil em 2020 tenha alguma relação com o então governo de Jair Bolsonaro, crítico do modelo político chinês, conforme especulado na época. “A Huawei vem cooperando com os governos brasileiros nestes 27 anos que está no País. Nossa decisão de não vender no Brasil foi pelo contexto geopolítico global e não nacional”.
Superado este momento, a companhia viu que era hora de voltar ao mercado de smartphones no Brasil. Em agosto, abriu sua primeira loja física, no shopping Cidade São Paulo, na capital paulista. A estratégia do momento, como explica Rulli, não passa por outras aberturas de espaços físicos próprios: “Não temos previsão de abrir novas lojas atualmente, mas fizemos uma parceria com a Fast Shop de criar balcões de vendas em diversas lojas deles, além de seguir investindo em plataformas como Magazine Luiza e Amazon, onde podem encontrar nossos produtos”, disse Rulli.
Entre os produtos que chegaram ao Brasil recentemente estão o Huawei Mate XT e X6, os smartphones dobráveis mais caros do mercado (custando cerca de R$ 33 mil e R$ 23 mil, respectivamente), além de smartwatches inéditos, como o Watch 5, para usuários comuns, e o Watch Fit 4 Pro, para atletas.
Vencendo a passos largos o velho preconceito com seus produtos, a Huawei agora enfrenta um novo desafio para crescer ainda mais no País, como explica o VP da companhia. “No Brasil o mercado é um pouco atípico, já que as empresas que produzem aqui tem grande incentivo fiscal e nós ainda não temos essa produção local. É tudo uma questão de oportunidade de escala”.
A avançada tecnologia dos produtos chineses é espelho do próprio país onde são criados: há 50 anos, o governo chinês tomou a decisão de liberalizar ligeiramente sua economia, dentro dos parâmetros do Partido Comunista Chinês, e deu início a um processo de investimento em pesquisa e inovação. Um dos melhores exemplos é a região de Shenzhen, próximo a Hong Kong. Há algumas décadas, era uma mera vila de pescadores e hoje se tornou em um dos principais pólos tecnológicos do mundo, com 21 milhões de habitantes, e sediando grandes empresas como a BYD, o WeChat, conhecido como o “WhatsApp dos chineses”, e a própria Huawei.
“Sem entrar no mérito do modelo político, a China é um governo que investe fortemente na educação de base e nas faculdades. Em paralelo, existe um planejamento econômico de médio e longo prazo onde os políticos são cobrados por resultados”, disse Rulli ao explicar o sucesso chinês em crescer tão rapidamente em tão pouco tempo.
A estratégia de potencializar negócios via ESG também está nas prioridades da companhia. A Huawei vem expandindo a banda larga de 4G e 5G em alguns lugares remotos do País, como ao longo das cidades ribeirinhas no Amazonas que tem potencial de beneficiar 4 milhões de pessoas. O VP da empresa chinesa ainda destaca que o leilão do 5G feito recentemente no Brasil, com o objetivo de expandir essa tecnologia para todo o País até 2030, foi muito bem feita e parabenizado por outros países, o que permite ações como essas. “Os chineses têm dado um foco grande em diversas práticas de ESG e nossa ação de levar conectividade para populações desconectadas é um exemplo disso”, explicou Rulli.