A construção civil brasileira enfrenta hoje uma barreira estrutural que não nasce nos canteiros de obras, mas no sistema tributário. A combinação entre carga elevada e normas complexas cria um ambiente de custos imprevisíveis e de insegurança jurídica, tornando arriscado investir na industrialização, caminho natural para o futuro do setor. Em vez de estimular a eficiência, a inovação e a sustentabilidade que esse modelo oferece, a lógica tributária vigente acaba penalizando quem busca modernizar e mantém distorções que comprometem a competitividade.
Toda a cadeia de processos industrializados depende de insumos fabricados, tecnologias de ponta e, muitas vezes, de uma logística interestadual. Nesse contexto, cada etapa da cadeia produtiva é impactada por uma série de tributos que incluem ICMS, PIS, Cofins e IPI, aplicados de forma cumulativa e divergente entre diferentes estados. Essa fragmentação fiscal encarece o produto final e cria uma assimetria competitiva que, não raro, desestimula quem aposta em inovação.
Um dos efeitos mais nocivos dentro dessa estrutura é a presença de concorrência desleal. Empresas que não cumprem integralmente todas as obrigações fiscais conseguem oferecer preços artificialmente mais baixos, fragilizando o equilíbrio do mercado industrializado. Em contrapartida, aquelas que seguem todas as exigências veem sua rentabilidade comprimida, com menos espaço para investir em pesquisa, tecnologia e expansão dos processos produtivos avançados, contribuindo para a perpetuação do atraso no setor.
Entre os entraves mais comuns enfrentados pelas empresas estão a insegurança jurídica e a complexidade interestadual. No cenário atual, produtos iguais podem receber classificações fiscais completamente distintas a depender apenas do estado em que se encontram, expondo empresas a disputas tributárias e obrigando-as a manter estruturas fiscais complexas e caras. Além disso, diferenças de alíquotas, incentivos locais e a cobrança do DIFAL tornam a comercialização entre estados mais cara e burocrática, minando a competitividade de quem busca atuar em escala nacional.
Como consequência, esse ambiente tributário desafiador eleva custos e compromete a capacidade de financiamento, a atração de investimentos e também o desenvolvimento do próprio setor. Projetos de alto valor agregado, como fábricas de componentes e sistemas construtivos industrializados, exigem grande capital inicial e horizonte de retorno mais longo. Sem previsibilidade tributária, investidores internos e externos exigem prêmios de risco maiores ou direcionam recursos para mercados mais estáveis e atrativos.
Esse contexto exige uma reavaliação tributária para destravar o potencial do setor. A simplificação de regras, a adoção de uma alíquota única nacional com aproveitamento integral de créditos e uma maior transparência na aplicação das normas são medidas que ajudariam a reduzir a cumulatividade de impostos e eliminar as distorções regionais. Independentemente dos mecanismos escolhidos, é evidente que mudanças são urgentes e que a participação ativa do setor produtivo é indispensável para que a legislação reflita a realidade operacional das empresas.
Um dos caminhos a ser debatido é o alinhamento da tributação aos objetivos de desenvolvimento sustentável. Ao reduzir a carga sobre materiais e tecnologias de baixo impacto ambiental, o governo poderia transformar práticas sustentáveis de um mero diferencial de marketing para uma escolha verdadeiramente vantajosa, inclusive economicamente. Incentivos fiscais para empresas que comprovem redução de materiais, diminuição de desperdícios e reaproveitamento de recursos criariam um círculo virtuoso em que sustentabilidade se traduz em competitividade.
A construção civil está diante da oportunidade de ser protagonista de uma nova agenda de desenvolvimento no Brasil, baseada em inovação, produtividade e responsabilidade ambiental. Para que isso ocorra, a tributação precisa deixar de ser um entrave e tornar-se um instrumento de estímulo. Reavaliar o sistema fiscal voltado à industrialização pode ser o cimento capaz de unir eficiência econômica e sustentabilidade ambiental, permitindo que o Brasil construa um futuro competitivo e duradouro.
*Rubens Campos é CEO da Espaço Smart