A guerra tarifária entre os Estados Unidos e a China pode impulsionar o agronegócio brasileiro e prejudicar os produtores rurais norte-americanos, avalia o jornal inglês Financial Times, em reportagem publicada neste domingo (13).
A situação acontece porque Pequim olha para o Brasil como uma fonte de uma série de produtos, como soja e carne bovina.
A publicação afirma que o Brasil foi um grande vencedor na primeira guerra comercial do republicano Donald Trump contra a China durante o seu primeiro mandato (2017–2021).
Nesta segunda batalha, o agronegócio brasileiro pode avançar em relação às exportações norte-americanas. Afinal, Washington taxou a China em 145%, enquanto Pequim taxou os EUA em 125%.
“É uma bênção para os agricultores do Brasil e da Argentina, e ajudará muito o setor”, disse o analista-chefe de agricultura da provedora de dados de commodities Kpler, Ishan Bhanu, em entrevista ao Financial Times.
“As consequências disso serão mais duradouras do que as medidas em si — na Ásia, os países construirão melhores relações com a América do Sul”, acrescentou.
As exportações brasileiras de carne bovina para a China cresceram cerca de um terço no primeiro trimestre de 2025, em comparação com o mesmo período do ano anterior, conforme dados de associações comerciais consultadas pela publicação britânica.
Também houve alta nas importações chinesas de carne de frango, que aumentaram 19% em março, na comparação anual.
Paralelamente, a forte demanda internacional impulsionou os preços da soja brasileira, que passou a ser negociada com um prêmio de US$ 1,15 em relação ao produto dos Estados Unidos nos mercados globais — um contraste com janeiro, quando o grão nacional era vendido com um desconto de US$ 0,25.
“A China está se movimentando rapidamente para garantir o fornecimento não só de soja, mas também de outras commodities”, disse o diretor internacional do Grupo Minas Portuário do Brasil, Rodrigo Alvim, ao Financial Times. “Isso resultará em menor demanda por grãos americanos.”
As exportações agrícolas dos EUA para a China caíram 54% em janeiro, reflexo das tarifas que reduziram as margens de lucro de processadoras chinesas.
O país asiático, que costuma comprar a maior parte do sorgo e metade da soja dos EUA, suspendeu parte das importações, e especialistas alertam que os embarques podem chegar a zero até maio, caso as tarifas não sejam retiradas.
Com isso, o Brasil tem ganhado espaço no mercado global. Segundo Aurélio Pavinato, da SLC Agrícola, a China busca diversificar fornecedores, e a Europa vê o Brasil como uma opção estável.
A guerra comercial iniciada na era Trump estimulou investimentos na agricultura brasileira, reduzindo a vantagem competitiva dos EUA. De 2016 a 2023, a participação dos EUA nas importações alimentares da China caiu de 20,7% para 13,5%, enquanto a do Brasil subiu de 17,2% para 25,2%.
“Com a China buscando diversificar seus fornecedores e a Europa cada vez mais enxergando o Brasil como uma opção estável, estamos observando um aumento na demanda externa e uma alta significativa nos preços”, disse Pavinato ao Financial Times.
Apesar de gargalos logísticos, o Brasil pode atrair mais capital chinês para melhorar sua infraestrutura. A União Europeia, que prepara tarifas retaliatórias sobre produtos agrícolas dos EUA, também pode aumentar a demanda por proteína vegetal brasileira, o que pressiona a oferta.
A competição com a China pode elevar os preços da ração e, por consequência, dos alimentos.
Pedro Cordero, da FEFAC, disse que os europeus compartilham a preocupação sobre o reflexo no preço dos alimentos.
“Iremos competir com a China, entre outros países, pelos mesmos produtos brasileiros. Isso significa preços mais altos para a ração e preços mais altos para os alimentos”, finaliza.